segunda-feira, 25 de junho de 2012

Surpresa no Paraguai: é possível reverter o golpe

Há resistência social no país e isolamento internacional dos golpistas. Aos poucos, desvenda-se trama que levou à quebra da legalidade

Por Antonio Martins

Nas primeiras horas de domingo, o presidente eleito pelos paraguaios, Fernando Lugo, abandonou a postura de resignação que mantinha desde sexta-feira, quando deposto, e tomou uma atitude que pode mudar o futuro imediato do país. Lugo dirigiu-se à rua Alberdi, no centro de Assunção, onde centenas de manifestantes haviam ocupado a TV Pública, em protesto contra ameaças de censura. Dirigiu-se a eles e à imprensa internacional sem meias palavras: “Sem dúvidas, foi um golpe. Um golpe parlamentar contra a cidadania e a democracia, e isso precisa ser denunciado aos quatro ventos”.

Precedida de intensa movimentação social e diplomática, a fala desfez a aparência de “normalidade” com que contavam os golpistas e seus apoiadores locais e externos – Estados Unidos e Vaticano, em especial. Está gerando uma reação em cadeia de resistências sociais e diplomáticas cujos lances mais recentes são a exclusão do “presidente” golpista do Mercosul e da Unasul (domingo à tarde) e a formação de um governo paralelo liderado por Lugo (esta manhã, em Assunção). Caso se mantenha, este processo pode reverter o golpe de Estado e colocar em novo patamar o que alguns chamam de “nova independência” sul-americana. Os fatos decisivos estão se produzindo neste início de semana: aos poucos, torna-se possível desvendá-los e romper a cortina de silêncio que os jornais comerciais brasileiros insistem em manter sobre o episódio.

A resistência avança explorando o calcanhar-de-aquiles dos golpistas: “como careciam de causas racionais que justificassem uma medida tão extrema, optaram por praticá-la com máxima pressa, explica, no jornal paraguaio Última Hora o analista político Alfredo Boccia. Ele prossegue: “O libelo acusatório causa vergonha alheia, de tão ridículo: não cuidaram das mínimas formalidades legais e atropelaram o respeito aos prazos de defesa”.
Lugo estava no Brasil, participando da Rio+20, quando a Câmara dos Deputados abriu, na quinta-feira, o “processo” que levaria a sua “cassação”. Washington Uranga, colunista do Página 12 argentino, conta: os opositores aproveitaram-se da ausência para concretizar finalmente uma ameaça que fizeram “em 23 ocasiões anteriores, pelos mais diversos motivos”. E mais: “a maioria destas manobras foi facilitada pelo próprio vice-presidente Federico Franco. (…) Sabendo que contava com os votos próprios [do Partido Liberal] mais os do Partido Colorado, em várias ocasiões o vice foi até a sede do governo para ameaçar Lugo e tentar extorqui-lo com a ameaça de juízo político, apenas para obter benefícios econômicos para si mesmo…”

Vinte e quatro horas depois, o Legislativo, que sempre bloqueou todas as iniciativas apresentadas por Lugo (da reforma agrária à nomeação de embaixadores), decretava seu impeachment por ampla maioria (39 x 4). A flagrante ilegalidade da aventura foi destacada pelo chanceler argentino Héctor Timerman, em entrevista ao Página 12: “Praticaram uma execução sumária. Darem duas horas de defesa a um presidente democraticamente eleito – um tempo menor que o se concede a quem recorre de uma multa por avançar um sinal vermelho”.

Mas quem dava respaldo aos aventureiros? “É muito provável que o pequeno Paraguai se dispusesse a confrontar as regras do Mercosul e da Unasul, entrando em conflito com seus dois vizinhos, se não contasse com o estímulo e proteção do governo norteamericano”, sugere o economista Flávio Lyra, num texto que Outras Palavras publica hoje. Na mesma entrevista ao Página 12, um relato do chanceler argentino confirma esta impressão. Timerman estava em Assunção nas horas que antecederam o golpe. Havia voado para lá com uma delegação de colegas da Unasul, alarmados pela perspectiva de deposição do presidente eleito. Reporta, em detalhes, as insistentes tentativas de diálogo dirigidas pelos diplomatas à oposição paraguaia – e a soberba com que foram rechaçadas. Eis um dos trechos: “Às 11h45 [de sexta-feira], faltavam 15 minutos para o começo do julgamento. Disse-lhes: ‘Senhores, virão épocas muito duras para o Paraguai, porque nós teremos de aplicar a cláusula democrática’. Não pareceu comovê-los em nada”. 

No final da tarde de sexta, Lugo estava deposto. Quase sincronicamente, em Washington, o porta-voz do Departamento de Estado para a América Latina, Darla Jordan, emitia nota que se calava diante do ataque à democracia, mas pedia “calma e responsabilidade” aos paraguaios… Ao contrário do que se informou no sábado, porém, a Casa Branca ainda não reconheceu oficialmente o novo “governo” paraguaio. Já o Vaticano e os bispos – que exercem forte influência, num país católico e conservador – foram menos sutis. Na quinta-feira, uma comitiva episcopal tentou, sem sucesso, convencer Lugo a renunciar. No domingo, o núncio apostólico Eliseo Ariotti, representante oficial do Papa no Paraguai, afirmou, a respeito da deposição do presidente: “alegra-me muito que o povo simples e todas as autoridades tenham pensado no bem do país”. Como se o grotesco da declaração fosse pouco, anunciou que celebraria uma missa na catedral “pela paz”. Na cerimônia, ofereceu pessoalmente a comunhão ao golpista (foto).


* * *

A primeira atitude de Lugo, após a deposição, foi conformar-se. Débil no Parlamento desde o início de seu governo, o presidente também viveu, ao longo do mandato, uma série de desencontros com os movimentos sociais. Houve erros de parte a parte, consideram Emir Sader  (em Carta Maior) e Santiago O’Donnel (em Página 12): o presidente não cumpriu a maior parte de seu programa; os movimentos não compreenderam que, sem apoiá-lo, ele não teria força para executar as reformas propostas. 

Por paradoxo, talvez o golpe tenha produzido uma aproximação necessária. A partir da noite de sábado, a TV Pública, criada por Lugo em 2011, converteu-se num centro da resistência popular. Centenas de manifestantes acorreram à rua Alberdi, assim que surgiram sinais de que o governo ilegítimo pretendia censurá-la. O Página 12 narra: naquela mesma noite, grupos de jovens construíram duas barricadas nas ruas de acesso. O cineasta Marcelo Martinessi, diretor nomeado pelo presidente eleito, alegrou-se: “as pessoas estão tomando este projeto como seu”. Um microfone foi estendido aos manifestantes: a resistência já tinha um canal para ir ao ar. 


Na manhã de domingo, Lugo compareceria ao local, para sua fala emblemática. Horas depois, os ativistas já eram milhares. Foram eles que rapidamente restabeleceram, à tarde, o fornecimento de energia e recolocaram a emissora no ar, depois de um corte executado pela agência nacional de eletricidade.

Os fatos vêm se acelerando desde então. Formou-se  uma Frente pela Defesa da Democracia no Paraguai. Mais tarde, ainda no domingo, Lugo deu novo passo e anunciou a formação de um governo paralelo, composto por seus ministros e com primeira reunião marcada para esta manhã. A edição desta manhã de Pagina 12 estampa uma entrevista  em que confirma “já começamos a resistência pacífica. (…) Já surgem manifestações de cidadãs e cidadãos. (…) O repúdio [ao golpe] crescerá”. O jornal confirma: estão programadas para hoje manifestações diante dos edifícios públicos e interrupção do trânsito em avenidas estradas.

Ao contrário do que ocorreu em tantos precedentes históricos, os governos da América do Sul parecem dispostos a reagir ao golpe. O envio de uma delegação de chanceleres a Assunção pode ser mais que um gesto simbólico. Ainda no sábado, convocou-se uma reunião de emergência do Mercosul, em Córdoba (Argentina), a partir da próxima quinta-feira. No domingo, anunciou-se que Fernando Lugo – e não o governo instituído por golpe – será recebido como representante do Paraguai. Num primeiro sinal de vacilação, Federico Franco, o presidente instituído pelo golpe, anunciou que pediria ao homem que depôs para “atenuar as tensões desencadeadas na América Latina”. Foi, evidentemente, rechaçado por Lugo.

Desde sexta-feira, os países da América do Sul estão retirando seus embaixadores de Assunção, em protesto contra o golpe de Estado. Há dois anos, na resistência ao golpe de Estado praticado em Honduras, o Brasil jogou papel destacado. Desta vez, a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, parece ter assumido este papel. Foi ela quem tomou a iniciativa, ainda na sexta-feira, de retirar seu embaixador de Assunção, “até o restabelecimento da ordem democrática”. Nos dias seguintes, o gesto seria seguido por Bolívia, Brasil, Equador, Uruguai e Venezuela. Nas últimas horas, aderiram ao movimento Colômbia e México, o que parece indicar uma tendência isolamento dos Estados Unidos. A própria Organização dos Estados Americanos, em outras épocas dominada por Washington está agora questionando a legitimidade da deposição de Lugo.

* * *
Ninguém é capaz de dizer, a esta altura, qual será o desfecho dos acontecimentos. Mas é evidente que uma sequência tão impressionante de fatos novos, cheia de surpresas, num país vizinho ao Brasil, seria um tema jornalístico de relevância máxima. A mídia brasileira, porém, trata-o de forma modorrenta e burocrática. Na maior parte das publicações, o Paraguai esteve nas manchetes apenas quando Lugo foi afastado. Ao contrário da imprensa argentina, nenhuma publicação ousou usar a palavra golpe.

No momento em que este texto é concluído, a manchete  da Folha de S.Paulo, em sua edição online, destaca as declarações do “chanceler” (do governo golpista paraguaio, que se queixa de ter sido afastado “sem defesa” da reunião do Mercosul… Por sugestiva coincidência,O Globo e Estado de S.Paulo, embora menos discretos, ocultam a série de reviravoltas em Assunção para destacar o mesmo personagem… Já o UOL, também do grupo Folha, enviou por algum motivo o repórter Guilherme Balza à capital paraguaia – mas tem relegado a segundo plano as ótimas matérias produzidas por ele (como este vídeo)…

O rápido surgimento de um movimento de resistência no Paraguai – e em especial o fato emblemático de ele ter por centro a TV Pública – revelam: talvez, também no Paraguai, a sociedade já seja capaz de superar as velhas formas de controle da informação e seus laços com os antigos donos do poder…


Matéria originalmente publicada no site Outras Palavras

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Uma pequena grande lutadora belga, agora sergipana


No dia de hoje, na Assembleia Legislativa de Sergipe, uma figura aparentemente muito frágil, de estatura pequenina, mas de um grande coração e personalidade marcante, vai estar recebendo o título de cidadã sergipana. Trata-se da belga Mathilda Antoniette Christine Hendriex, mais conhecida – principalmente na bela, mas paupérrima região do baixo São Francisco – como Irmã Francisca. Uma justa e importante iniciativa da deputada estadual Professora Ana Lúcia, do PT. Já era tempo.

Conheci essa brava e extraordinária lutadora social em 2007, quando tive a oportunidade de escrever sobre a sua vida para um jornal do mandato do então deputado federal Iran Barbosa, do PT. Liguei pra ela, conversamos por telefone, marcamos a ida à Pacatuba para a entrevista. Ela sem me conhecer, e eu louco para conhecê-la, pelo tanto que já tinha ouvido falar desta belga, que desde 68 largou a família e o conforto do seu país para vir pra Sergipe, evangelizar e também lutar pelos mais pobres e por reforma agrária neste estado de coronéis a dar de bala nos mais ousados.

Por muitos motivos, guardo aquela viagem como ‘muito especial’ pra mim, tanto na ida como na volta. Cheguei em Pacatuba no começo da tarde, e foi muito fácil achar a casa da Irmã Francisca. À primeira pessoa a quem perguntei pela missionária na praça principal da cidade já indicou o caminho. Todos ao seu redor também ajudaram a apontar o local.

Chegando lá, foi com muita alegria que a irmã e outras missionárias me receberam. Casinha simples, mas muito gostosa e aconchegante, jardim florido, alegria e paz no ar. E então passei a conversar por mais de uma hora com a belga de Wilderen. Ao longo da entrevista, descobri a força e a determinação daquela pequena senhora, que dedicou e arriscou a sua vida em prol de pessoas que muitas vezes nem conhecia, mas resistia junto com elas, no ensinamento e na luta, pregando a correta mensagem de que “terra é direito de todos”.

Entre muitas disputas com fazendeiros e jagunços, expulsões de ocupações e acampamentos, e conquistas de terras em favor dos camponeses, a belga que agora se torna sergipana deixa muitas e valiosas lições, entre as quais, que nunca se deve desistir da luta, e que a consciência de classe e de direitos por parte dos trabalhadores, seja da cidade ou do campo, é fundamental no enfrentamento às oligarquias e às elites dominantes, que querem tudo pra si, deixando as migalhas para o resto do povo.

Reproduzo abaixo a entrevista feita há cinco anos, porque também descobri que é um dos poucos registros na nossa imprensa da vida desta pequena grande missionária. Infelizmente, no meio da nossa miopia social, perdem-se os registros históricos de personalidades fundamentais na construção de nossa sociedade e nas lutas camponesas e dos trabalhadores. Irmã Francisca é uma dessas figuras emblemáticas. Fico feliz em ter tido a sorte e a oportunidade de escrever um breve perfil da sua vida aqui em Sergipe. Pena ter sido para um jornal tablóide, ou seja, com espaço curtinho para uma história tão rica e bela.

No registro, descobri um pequeno lapso de tempo numa fala da Irmã, quando ela diz que já tinha 42 anos em Sergipe. O ano era 2007, e se ela chegou por aqui em 1968, tinha 39 anos em solo sergipano. Mas manterei o texto conforme foi construído. É coisa pequena, diante de tão grandioso exemplo de vida.

--

Irmã Francisca: “Não me canso de lutar”

Se alguém passar pelo Baixo São Francisco e procurar saber quem é Mathilda Antoniette Christine Hendriex, dificilmente obterá resposta. Mas pergunte quem é Irmã Francisca e, de imediato, todos indicarão onde mora uma senhora de estatura mediana, corpo franzino, sorriso largo e acolhedor, sotaque estrangeiro, mas já ‘temperado’ à brasileira. Esta belga de 77 anos, nascida na pequena cidade flamenga de Wilderen, na província de Namur, norte da Bélgica, veio para o Brasil em 68, como missionária-educadora.

Ela e mais três missionários belgas aterrissaram em terras brasileiras num momento conturbado da vida política do país. O ano era 1968, em pleno recrudescimento do Regime Militar com o Ato Institucional nº 5. Foram direto para Japaratuba, atendendo ao chamado do bispo da diocese de Propriá, Dom José Brandão de Castro, para se juntar a outros belgas que aqui já estavam, entre eles Gérard Lothaire Jules Olivier, ou Padre Geraldo, ex-prefeito de Japaratuba. “Eu ia evangelizar na África. Mas nos pediram para vir para o Brasil, através do Dom Brandão, então eu vim”, recorda.

O nome, Francisca, vem da veneração por São Francisco de Assis e seus ensinamentos. Sua vida no Brasil e a força para lutar pelas causas do povo e por reforma agrária também tiveram a inspiração em nomes como Dom José Brandão, Pedro Casaldáliga, Frei Beto e Leonardo Boff.

Nada foi obstáculo para Irmã Francisca. Problemas com a alimentação, o clima, e o idioma – o curso de português feito em nove meses, ainda na Bélgica, não ajudou muito no início. “A minha raiz flamenga só ajudou mesmo na pronúncia. Mas o português mesmo foi muito difícil. Só melhorei com o tempo”, conta.

LUTA PELA TERRA

Francisca lembra que, como educadora, teve algumas dificuldades de entrar no meio do povo, por sua cor e pela dificuldade no idioma. Ela, as outras duas irmãs e Padre Nestor, o outro missionário do grupo, seguiram os passos do padre Gerard, que já pregava a reforma agrária na região de São José, em Japaratuba. “Trabalhamos juntos e ali crescemos muito”.

Já entre 1973 e 1974, o grupo de Francisca, a Congregação Irmãs da Caridade, deixou a cidade de Japaratuba e foi trabalhar com os posseiros. “Fomos para Canhoba, reduto de fazendeiros e com muitos problemas de conflitos por terra. Fomos trabalhar na roça, evangelizar e conscientizar aquela gente de que a terra era direito de todos. Claro, tivemos problemas”, diz.

Com o tempo, aquilo foi incomodando os fazendeiros e criando tensão. Dom José Brandão de Castro, então bispo de Propriá, apoiava o grupo, mas a tensão só aumentou, até explodir. “De uma hora pra outra, tivemos que fugir para Propriá no meio da noite pra não morrer, deixando tudo para trás”, relata a missionária.

Depois de Canhoba, o grupo ‘perambulou’ por quase cinco anos entre Betume, Ilha das Flores e Brejo Grande, agora ao lado também do Frei Enoque. “Vivíamos mais dentro de um Jeep que em casa. Como a gente mexia não só com o religioso, mas com o social também, mais uma vez tivemos problemas, desta vez em Ilha das Flores. Acabamos novamente expulsos por fazendeiros e gente ligada à própria Igreja. Saímos com pedras atiradas às costas”, relata.

Sem nunca desistir, no início dos anos 80 seguiram para nova frente, agora em Pacatuba, na área da Fazenda Santana dos Frades, onde posseiros viviam à míngua, sendo constantemente ameaçados por fazendeiros e seus jagunços. Até se conscientizarem e passarem a lutar pela terra na qual viviam.

“Foi uma luta muito grande ao lado daquele povo. Foi ali que Dom Brandão se engajou mesmo na luta pela terra. Ele foi evoluindo ali, junto com a gente, compreendendo a urgência de lutar pela sobrevivência daquele povo. Ficamos três anos, até que conseguimos a posse da área graças ao apoio de muitas entidades e de muita gente de fora. Depois, não deixamos mais Pacatuba”.

Depois da conquista de Santana, outra grande luta de Irmã Francisca: a conquista da Lagoa Nova. Foram 16 anos de muita luta, conflitos e enfrentamentos, até quando saiu a imissão de posse da área em favor dos posseiros. “Confesso que houve momentos em que eu pensei em desistir. Foi muito sofrimento. Mas a amizade pelo povo falou mais forte. E valeu a pena. Foi uma grande vitória”.

BALANÇO DE VIDA

Olhando o que ficou para trás ao longo de 42 anos, Irmã Francisca sorri e, sem pestanejar, avalia: “A gente veio pra cá sem saber muito bem o que iria viver. Outro continente, outro país, outra cultura, enfim; mas para mim foi muito válido. Só posso dizer que valeu a pena. Se tivesse que fazer tudo outra vez, faria”.

Para ela, só uma ampla reforma agrária resolveria grande parte dos problemas do Brasil. “Não tem como empregar o povo senão dando terra para as famílias trabalharem. Reforma agrária é vital para o Brasil”, defende a missionária. “Ter a ajuda política é imprescindível. A politização do povo também é muito importante, porque ainda tem muita luta pela frente”, avalia.

Sobre a dicotomia das nacionalidades, Irmã Francisca responde com franqueza: “Com 42 anos aqui, não há mais retorno. Sinto-me muito mais brasileira que belga, e o povo daqui me adotou. Tenho laços familiares na Bélgica, mas aqui é a minha vida”, revela a lutadora do povo, que sempre espera por novos desafios. Ela finaliza com uma frase que resume todo o seu estilo de viver, mesmo depois de quatro décadas passando por cima da incompreensão e do atraso em terras sergipanas: “Não me canso de lutar. Nunca”.