Começa a temporada de pesquisas de opinião pública, com safras cada vez mais rotineiras. O eleitor, cada vez mais, será consultado antecipadamente à consulta principal, na urna, que só acontece daqui a alguns meses. Até o primeiro turno das eleições, em 3 de outubro, muita água vai rolar por debaixo da ponte.
Mas há pesquisas e pesquisas, e suas interpretações, uma caixinha de variadas fórmulas. A questão não são os números que apontam, para candidato A, B ou C, as preferências do eleitorado naquele determinado espaço de tempo, mas as interpretações que “especialistas” dos mais variados naipes dão a eles. Mesmo que os frios números não digam o que os especialistas interpretativos querem que eles digam, faz-se um esforço de espremer percentagens e tirar duvidosas lucubrações para que apareçam como resultado positivo, o que nem sempre são. Tudo é questão de interpretação, ao gosto do freguês; desliza ao saber da maré para que o barco, mesmo que em meio à turbulência, pareça estar na mais serena enseada.
A matemática é simples e objetiva: 2+2 são 4; além disso, é ciência, precisa e exata. Mas pesquisa de opinião, mesmo que os profissionais que atuam nesse (lucrativo) mercado, na ânsia de atribuir maior "nobreza" ao desenvolvimento da sua atividade, digam que se trata de uma ciência, fatos passados e recentes não permitem que se leve tal afirmação muito a sério.
Na semana passada, uma dessas pesquisas “ao gosto do freguês” saiu do forno e colocou o prefeito de Aracaju Edvaldo Nogueira num oásis de popularidade. Segundo esta, 86% dos aracajuanos aprovam a gestão do comunista. Mais interessante que a popularidade “lulesca” do prefeito, é a pesquisa ter pipocado num momento muito ruim para o chefe do executivo da capital, que saiu com a imagem bem arranhada após as fortes chuvas que caíram sobre a cidade por quase uma semana, trazendo à tona problemas com alagamentos em vários bairros e que poderiam ter sido evitados, se a prefeitura tivesse feito obras de infraestrutura necessárias para a contenção e mitigação dos temporais, que sempre chegam com o outono. Isso, certamente, irritou grande parte da população, principalmente quem perdeu casas e bens materiais de uma vida toda.
Com o “Ibope” em baixa, nada como uma boa pesquisa para levantar o moral. E ela veio, em hora das mais apropriadas para o alcaide. Mas quando se destrincham os números, vê-se que eles foram supervalorizados por quem lhes deu interpretação. À pergunta “como o senhor classifica a administração do prefeito Edvaldo Nogueira?”, 10% acham a administração ótima, 40% acham boa e 36% acham regular. Até aí, tudo bem, mas se 36% dos entrevistados a acham regular, isso não pode ser interpretado objetivamente como positivo, mas subjetivamente como um meio termo entre positivo e negativo. Portanto, a depender da interpretação que se queira dar a esse número, poder-se-ia dizer da mesma forma que 36% desaprovam a administração do prefeito. Tudo é questão de interpretação.
A pesquisa também apontou dados conflitantes. Nela, como já foi dito, 10% acham ótima a administração de Edvaldo; 40% acham boa; e 36% a vêem como regular. Mas seguem ou números: 4% acham ruim; 9% acham péssima; e 2% não souberam responder. Aí surge o inesperado. Somando-se todos os índices, chega-se a 101%, quando estes números deveriam somar 100%. Foi uma festa para os opositores do prefeito, que caçoaram um bocado dos números. Esse 1% pode até não mudar em nada o resultado final buscado na pesquisa, mas certamente a compromete dentro do processo empírico de uma sondagem estatística.
Mas pior que isso é ver que pesquisas de opinião pública têm também a capacidade de revelar a natureza astuta do homem de só aceitar o que lhe convém.
No dia 27 de março, o instituto Datafolha, que pertence ao jornal Folha de São Paulo, publicou pesquisa sobre a sucessão presidencial que surpreendeu a todos, por dar ao então governador de São Paulo, José Serra (PSDB), um sobressalto eleitoral que o jogou bem à frente da pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, num período em que esta vinha crescendo nas sondagens.
O Datafolha, de forma ardilosa, ante um inseguro Serra quanto à sua desincompatibilização do governo de São Paulo para se lançar à corrida presidencial, para não jogar chope na festa preparada pelos tucanos, tratou de dar “uma forcinha” ao seu candidato, apontando sua subida em quatro pontos percentuais e queda da petista em um ponto, freando assim a escalada vertiginosa de Dilma das últimas semanas.
Foi uma festa para o tucanato, um regozijo para os demistas. A oposição riu à toa de norte a sul do Brasil. A farsa midiática teve lá o seu efeito, alegrando a torcida emplumada, mas foi tão grotesca que nenhum outro instituto quis embarcar nela.
Duas semanas depois, pesquisa Sensus, encomendada pelo Sintrapav (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Construção Pesada de São Paulo), apontou o que todos já sabiam e esperavam: empate técnico entre o tucano José Serra (32,7%) e a petista Dilma Roussef (32,4%), o resultado mais apertado já obtido entre os dois até então.
A tucanada baixou a bola, mas não perdeu tempo e partiu pra cima da pesquisa. Líderes do PSDB saíram para trombetear que a pesquisa, que não lhe era mais tão favorável, por ser encomendada por um sindicato de trabalhadores – portanto, favorável à trabalhista Dilma –, não tem valor, tendo apenas o objetivo de impactar negativamente a campanha de Serra. Como se não bastasse tamanha arrogância e preconceito de classe, o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), saiu com essa pérola: "Os institutos de pesquisa deveriam ter um certo regulamento. Eu acho meio surreal um sindicato encomendar pesquisa".
Um disparate. Pelo jeito, pra essa turma, pesquisa de opinião pública só pode ser encomendada por empresários, sindicatos de patrões e realizada pelos institutos que eles apontam. Fora disso, não tem valor. Nada mais estúpido. A Folha, como veículo de comunicação social, mentir e manipular – aliás, como sempre faz quando quer defender os seus interesses –, isso é que é chocante (e revoltante).
Mas como eu disse no início deste artigo, há pesquisas e pesquisas. Cabe ao povo buscar compreender o que há por trás dos seus dígitos e percentuais, saber interpretá-las à luz da razão, e não ao sabor dos interesses daqueles que buscam nos números e estatísticas as respostas e efeitos que lhes convém.
George, nunca fui muito fã de pesquisa. Por um tempo tive acesso a esse tipo de trabalho e sempre achei estranha a variação na forma de divulgar os resultados. Mas a mídia adora esse tipo de coisa. Um abraço.
ResponderExcluirO problema das pesquisas é que o universo pesquisado nunca é noticiado e por isso leva a manipulação e interpretações errôneas. Pode-se fazer uma pesquisa sem distorção dos número beneficiando um candidato. Basta se fazer as pesquisas em cidades onde ele tem boa popularidade. Clara, para o eleitor saber se está sendo enganaod teria que se ver os locais onde se fez as pesquisas (o universo pesquisado).
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