É cada vez mais difícil tecer uma opinião contrária ao establishment que ora vinga nestas terras de Serigy. Parece que chegamos a um momento da vida social sergipana que qualquer crítica feita a Marcelo Déda ou ao seu governo, o autor da crítica é logo tachado de “oposicionista”, “revanchista”, “sabotador”, “cego”, “jurássico”, “demista”, “joãoalvista”, e de tudo que é adjetivo negativo ou pejorativo similar a estes.
É extremamente irritante, por exemplo, ouvir os programas ditos jornalísticos nas manhãs de segunda a sexta-feira. É preciso ter sangue de barata para aguentar as intervenções de muitos ouvintes, metralhando qualquer um que ouse tecer comentários negativos ao atual governo. Sendo esses comentários direcionados a Déda, aí é que a coisa fica feia. É uma chuva de impropérios e provocações, principalmente quando o autor da crítica é do movimento sindical. Para estes, é inadmissível qualquer análise mais crítica a respeito do governo e do governador. É o dedismo dominando a vida sergipana sem igual paralelo.
Mas fica muito claro, depois de uma saraivada de audições radiofônicas matutinas, que a maioria das intervenções desses ouvintes “indignados” nos programas de rádios locais – já famosos por se tornarem verdadeiros ringues em períodos pré-eleitorais –, são dos chamados ratos de rádio (gente paga para estar defendendo interesses de grupos políticos).
Ouve-se, claramente, o discurso “ajeitado”, a fim de atender a um padrão de resposta preestabelecido, formatado para que não dê chances de que o importuno que ousou invadir as ondas do rádio pra colocar Déda de saia justa deixe a entrevista sem carregar consigo a pecha do sujeito do contra e que quer desestabilizar o seu governo.
Se são jornalistas os que pensam contrário, saem com tarja de “vendidos”; se são sindicalistas, acabam rotulados como “jurássicos”, “anacrônicos” e outras pérolas do gênero. Quando não, sindicalistas, os mesmos que lutaram por décadas, contra a Ditadura, as oligarquias e a direita patrimonialista e conservadora para ver um governo progressista na condução deste Estado, mal pode usar a imprensa – quando esta se interessa de ouvi-los – para se expressar, porque logo vêm as pedras, atiradas por aqueles que outrora estiveram do outro lado da trincheira, ou por seus paus-mandados – as tais ratazanas de rádio, que se reproduzem como uma praga.
É impressionante e, de certa forma, preocupante, esses ataques desmesurados aos que tem coragem de ter pensamento ou posição divergente, de remar contra a maré, porque o que estamos vivenciando é a tentativa de construção de um pensamento único, onde posições contraditórias não são respeitadas, tampouco admitidas. Essa ideia é de causar calafrios.
Quando não nos permitimos sequer ouvir e respeitar a opinião ou posição alheia, mesmo que ela não nos seja favorável, estamos construindo uma relação de via única, onde só um lado impõe a sua verdade. Isso não cabe numa democracia, mas em regimes totalitários, dos quais tivemos experiências e guardamos amargas lembranças.
Assim como não cabe o uso de gente que não tem o menor escrúpulo, a ponto de receber dinheiro (e põe dinheiro nisso... fala-se em até R$ 4 mil, conforme esquemas já denunciados em blogs locais) para se prestar ao papel de ventríloquos político-partidários para atacar, de forma muitas vezes rasteira e, os que divergem da condução do governo ou das posições do chefe do executivo estadual.
Saber ouvir é uma arte, como também uma posição filosófica das mais nobres. Não pode querer falar aquele que não sabe ouvir. Saber ouvir posições contrárias é, antes de tudo, um exercício fundamental para o bom desenvolvimento da sociedade. Nenhum povo do mundo antigo contribuiu tanto para a riqueza e a compreensão da Política, no seu sentido mais amplo, como o fizeram os gregos. Foram os gregos que inventaram não apenas a democracia, mas também a política, entendida como “a arte de decidir através da discussão pública”. A Ágora, a assembleia grega, era como um verdadeiro comício ao ar livre, aberta a qualquer interessado, e qualquer tema, absolutamente qualquer tema podia ser discutido, sendo que, em princípio, todos os presentes tinham o direito de tomar a palavra: era a isegoria, “o direito universal de falar na Ágora”, um sinônimo de democracia. E todos ouviam, e todos falavam... ninguém atirava pedras em niguém!
Ainda bem que na Grécia Antiga não havia rádio, muito menos as ratazanas radiofônicas. Certamente, havendo, as “ratazanas gregas” poderiam pôr a perder a célebre e promissora democracia que ali nascia e se desenvolvia, e a humanidade não evoluiria socialmente. Ainda bem.
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